Fundos de pensão: Eventos colocam foco na governança


Dois eventos diferentes promovidos pela Abrapp em momentos diversos de agosto,  mas que em alguns de seus painéis coincidiram ao colocar o foco em um tema que não por acaso vem ganhando uma atenção crescente das entidades. Um deles foi o 11º Encontro Nacional de Advogados das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (ENAPC), o outro o seminário Desafios da Gestão de Investimentos dos Fundos de Pensão, sendo que ambos reservaram parte de seu tempo para a temática da governança.

 

Para enfrentar os desafios que a diversificação de ativos trará para os fundos de pensão nos próximos anos, ficou claro no segundo desses eventos, um requisito fundamental será o aprimoramento da governança, acompanhado por um esforço especial de gestão de riscos e educação previdenciária. Essa foi a conclusão que marcou o seminário Desafios da Gestão de Investimentos dos Fundos de Pensão, a partir de avaliações feitas por dirigentes de Entidades Fechadas de Previdência Complementar e especialistas do mercado sobre investimentos em momentos de crise. Num ambiente global em que é preciso diversificar cada vez mais para garantir o mesmo retorno, a governança é peça essencial, sublinhou o diretor superintendente da Previ-Ericsson, Rogerio Tatulli. Ele lembrou que a entidade mantinha, até 2010, um nível muito baixo de diversificação, mas de lá para cá aumentou sensivelmente sua exposição a diversas classes de ativos, o que tem produzido resultados positivos.

 

Não é simples - “As EFPC precisam se habituar a uma trajetória diferenciada em seus investimentos no caminho rumo ao cumprimento das metas atuariais”, disse o dirigente. Com patrimônio de R$ 1,194 bilhões sob gestão, a Previ-Ericsson elevou de seis para 27 o número de gestores e de seis para 32 o número de fundos de  investimentos desde 2010. ”Não é simples administrar tudo isso, é preciso ter metas claras para os gestores e suas performances”.

 

A partir do conceito segundo o qual “especulação não combina com fundo de pensão”, o superintendente defende a importância de capacitar dirigentes e ter uma comunicação transparente com os participantes, assim como a formalização de todas as decisões.  “O controle adequado de riscos e processos é outro quesito vital para enfrentar crises”, observou Tatulli. “Maior clareza sobre os riscos e elevada qualidade de governança são fundamentais na preparação das EFPC para enfrentarem os diferentes ciclos econômicos”,  pontuou por sua vez o gerente executivo da Gerência de Investimentos Estratégicos da Previ, André Tapajós Cunha, um dos integrantes do painel sobre a gestão de investimentos em momentos de crise.

 

Em qualquer situação, mas particularmente nos ambientes de instabilidade, é preciso ter clareza sobre o perfil de risco. “Isso é essencial para tomar decisões em momentos de crise e isso exige preparo especial, com políticas de investimento robustas e que olhem as peculiaridades dos planos, assim como um conjunto coerente de diretrizes que permitam a gestão de investimentos de longo prazo”, explicou Tapajós. Além disso, ele destacou a importância de um fluxo de caixa capaz de cobrir o cumprimento das obrigações do plano e atenção particular à liquidez dos ativos. “A liquidez perpassa todas as nossas carteiras, inclusive em investimentos estratégicos, onde estão aqueles que têm acordos de acionistas, isso é necessário para que a Previ possa alienar ativos como e quando achar necessário”.

 

Educação e comunicação - Educação previdenciária é outro aspecto essencial nesse caminho, lembrou Tapajós, até porque as novas gerações tem um olhar diferente para a questão dos investimentos e de sua poupança para o futuro. Na Previ, o plano Previ Futuro, que já tem R$ 7 bilhões de patrimônio, há quatro perfis de investimentos, cada um com  um  percentual específico de exposição a renda variável, o que exige ainda maior esforço de educação e comunicação com os participantes. O Prefi Futuro é o plano aberto a adesões dos funcionários do Banco do Brasil, enquanto o Plano I, o maior deles, já está fechado. “No Previ Futuro, sabemos que em alguns anos a gestão será feita exclusivamente por funcionários que participam do próprio plano, um passo importante para a governança, e estamos fazendo a preparação para essa nova etapa”.



Mais legislação ? - Alguma nova legislação é necessária para melhorar a governança dos fundos de pensão? A indagação conduziu o painel “Novo Paradigma de Governança nas EFPC: um Olhar Jurídico”, que encerrou o 11º Encontro Nacional de Advogados das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (ENAPC). O presidente da Abrapp, José Ribeiro Pena Neto, que atuou como moderador, manifestou a  certeza de que não: “Não acredito que nosso problema seja a falta de legislação. Nós precisamos de mais envolvimento e dedicação dos fiscais e dos fundos para alcançar, cada vez mais, a boa governança e a transparência desejável. Obviamente algum aperfeiçoamento pode ser necessário, não em legislação, mas em temas de regulação, que o CNPC pode complementar. Não precisa mexer nas leis 108 e 109, que são nossos marcos legais”.

 

O tema governança, disse José Ribeiro, é muito atual, mas sempre esteve na ordem do dia dos fundos, especialmente depois da Resolução nº 13 do CGPC. Ele lembra que muitas vezes é chamado para discutir o assunto e verifica que algumas pessoas têm uma visão “distorcida” de que a governança dos fundos “não é adequada”. Para ele, o padrão de governança dos fundos é “bastante avançado” e “os casos de desvio de conduta são absolutos pontos fora da curva”. Mas admite a possibilidade de “aprimoramentos”.

 

O consultor jurídico e membro da Comissão Técnica Nacional de Assuntos Jurídicos da Abrapp, Luiz Fernando Brum, concorda. Brum acha que é um traço cultural do brasileiro achar que “tudo se resolve por meio de lei”, que estabelece o que se pode e o que não se pode fazer, e lembra que são diversos os projetos que tratam de governança em tramitação no Congresso Nacional. Mas ele destaca o projeto de lei 274, da Câmara dos Deputados, e o projeto de lei 268, do Senado, ambos deste ano.

 

Nascido de conclusões e recomendações da CPI dos Fundos de Pensão, o PL 274 tem várias sugestões  positivas na avaliação de Brum, como a proposta de inserção do comitê de investimento na estrutura de governança da entidade e a instituição da auditoria interna. Já o PL 268 vai no sentido inverso do projeto da CPI em vários aspectos e trouxe pontos polêmicos como a obrigatoriedade do processo seletivo para a diretoria executiva e o conselheiro independente. Brum acredita que o assunto só deve voltar ao debate após as eleições municipais e tem esperança na aceitação de um substitutivo mais adequado, embora ainda veja pontos negativos.

 

Para o consultor, mais importante do que a forma de escolha dos dirigentes, processo seletivo ou eleição, é quem é escolhido, o que remete à questão da ética, sublinhada por Luiz Antonio Muniz Machado, advogado sócio do escritório LA Machado Advogados Associados, no 11º ENAPC. Brum afirma que essa experiência recente dos fundos ilustra além do problema de se superestimar o poder da lei, o excesso de intervencionismo estatal. “Governança é dever de casa. A entidade deve ter dentro de sua estrutura de governança órgãos independentes, compostos por pessoas qualificadas, que sigam padrões éticos. Isso é mais importante que qualquer forma definida de escolha de membros de diretoria executiva”, afirma, elogiando a iniciativa da Abrapp de apoiar a autoregulação.

 

Comunicação - Também presente ao debate, Ana Paula Oriola de Raeffray, advogada sócia do escritório Raeffray Brugioni Advogados, chamou a atenção para a importância da atuação do participante para zelar pela governança do fundo. Ana Paula refere-se a estudos internacionais que vinculam a empatia do participante a três vertentes. Uma delas é a legibilidade das normas, que garante ao associado ao plano ler e entender as regras e comunicados. Outra é a identificação clara dos responsáveis que podem ser contatados para fornecer informações ou explicações. A terceira é a capacidade de reação do participante.

 

Ana Paula defende que o participante tem que ser fortalecido, ter interesse e ser vigilante. “O participante tem que ser o principal interessado. As pessoas têm que controlar o que lhes interessa”, acrescenta, questionando se a elaboração de mais normas e modelos vai tornar o participante mais interessado. José Ribeiro concorda que os fundos precisam estimular o participante a “fazer jus a seu nome” e que ele é o melhor fiscal, até porque está dentro das entidades  

Diário dos Fundos de Pensão
Tel: 11 5044-4774/11 5531-2118 | suporte@suporteconsult.com.br