2014, a eleição dos partidos 'faz de conta'


A eleição de 2014 marcará o auge de um processo de esvaziamento dos partidos brasileiros que sobrevivem apenas em função da burocracia do sistema jurídico e do corporativismo dos políticos. A miríade de siglas legalmente registradas configura um cenário fantasmagórico onde as identidades, programas, projetos e ideologias acabaram pasteurizadas a ponto de ninguém hoje conseguir distinguir quem é quem no sistema partidário.

As evidências estão materializadas no noticiário pré-eleitoral da imprensa, que é uma coadjuvante compulsória neste processo de alienação partidária no Brasil. A mídia esperneia, reclama, mas pouco faz para mudar o status quo.

Antigamente, os partidos se distinguiam mais pelos seus programas e ideologias do que pelos candidatos. Hoje é o contrário, os programas e ideologias são acomodados segundo os interesses do candidato.

A mais nova evidência dessa inversão de prioridades é o caso da ex-ministra Marina Silva, que surgiu na política às custas da inovadora ideia da sustentabilidade como parâmetro principal para o desenvolvimento econômico. Como não conseguiu que a Rede Sustentabilidade fosse reconhecida legalmente como partido, Marina correu para os braços do Partido Socialista Brasileiro para tentar se eleger vice-presidente da República. Com a morte do candidato Eduardo Campos, a ex-ministra do Meio Ambienta acabou na cabeça da chapa socialista.

O PT, cujo sucesso eleitoral no início do século foi alavancado pela imagem operária e pelo sonho de mudança, hoje se transformou num aglomerado de interessados em cargos públicos e na continuidade no poder. O PSDB não tem mais nada da ideologia socialdemocrata. O mesmo vale para o extinto trabalhismo no PTB. 

Até os herdeiros do comunismo no Brasil adotaram um discurso revisionista em relação aos princípios do marxismo-leninismo. O Partido Socialista Brasileiro (PSB), que é outra sigla surgida da socialdemocracia, não conseguiu se atualizar ideologicamente e perdeu identidade, processo similar ao do PDT, que na falta de Brizola se transformou numa legenda de ocasião.

A maioria absoluta dos partidos políticos brasileiros transformou-se em meros trampolins para personalidades interessadas num emprego parlamentar. Cumprem uma função burocrática determinada pela Justiça Eleitoral como parte da legislação vigente. Entre elas, o polêmico loteamento do horário eleitoral gratuito, que de tanto ser regulamentado para atender a egos e interesses se transformou numa caricatura da ribalta eleitoral.

Como os programas passaram a depender das estratégias eleitorais e dos interesses dos candidatos, os conteúdos ideológicos e programáticos divergem apenas nos detalhes, quase sempre de difícil compreensão pelo eleitor. Outra consequência é a formação de alianças partidárias materializadas em coligações esdrúxulas, que contribuem ainda mais para a perda de credibilidade dos partidos.

A mística ideológica responsável pelo passionalismo de pleitos passados foi substituída pela magia do marketing eleitoral, cujos meandros são conhecidos apenas por uns poucos especialistas contratados a peso de ouro. Eles trabalham em função de resultados e migram para quem paga mais ou a quem dedicam maior simpatia, sem se importar muito com os princípios teóricos.

O sistema partidário brasileiro é um cadáver insepulto, cujo óbito os políticos não têm coragem de atestar porque isso ameaçaria posições e vantagens conquistadas. Passamos a viver uma ficção alimentada por fantasmas cuja existência nos obriga a refletir até que ponto o público e a imprensa acabaram se acostumando com o faz de conta partidário, protagonizado por 32 siglas registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O desafio não é acabar com os partidos políticos, mas sim o de evitar que desvirtuem o exercício da democracia, da qual eles, teoricamente, são uma peça básica.

Carlos Castilho – jornalista, professor, autor.

Fonte: site Observatório da Imprensa

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