E se houver ETs?


O que aconteceria se a humanidade constatasse que existe outra civilização inteligente e tecnologicamente avançada habitando o Universo? Esse é o tema de um dos livros mais fascinantes do ano, chamado "The Three-Body Problem" (o problema de três corpos).

Foi escrito pelo chinês Liu Cixin, chamado pela imprensa dos EUA de "O Arthur C. Clark da China". O livro (que é de 2007, mas só foi lançado em inglês neste ano) acaba de vencer o prêmio Hugo, equivalente a um Nobel da ficção científica. Detalhe: é a primeira vez que um asiático é o grande vencedor.

Todas as distinções são merecidas. Cixin cria uma trama política e científica que expande a imaginação e, por tabela, nossa percepção da realidade. A história começa durante a Revolução Cultural na China nos anos 1960. Uma cientista (e prisioneira política) identifica uma mensagem cósmica que diz: "Sou um pacifista no meu mundo. Não responda a essa mensagem! Se houver resposta, seu planeta será conquistado". Sem hesitação, ela responde na hora: "Venham! Nossa civilização não é mais capaz de resolver seus problemas. Precisamos que sua força intervenha".

No caso, a civilização extraterrestre precisa imigrar a todo custo. Ela habita um planeta com três sóis. Só que a órbita entre eles é caótica. Isso gera períodos climáticos imprevisíveis, que levam a sucessivas extinções e renascimentos. Prever a órbita de três corpos celestes entre si é problema que não tem solução matemática definitiva (daí o nome do livro).

O livro defende que a descoberta de ETs inteligentes, ao contrário do senso comum, seria uma má notícia. A mera constatação de sua existência dividiria as pessoas, exacerbando conflitos, gerando polarização e choques entre as diferentes culturas terrestres.

No livro, uma parcela da humanidade começa a apoiar os invasores, dividida em três grupos: os adventistas, que defendem a destruição completa da civilização; os redentoristas, que pregam a convivência com os invasores; e os sobreviventistas, que querem ajudar na conquista em troca de sua própria sobrevivência.

O livro é ainda uma bela imersão na cultura chinesa. Isolados que somos, raramente temos a chance de mergulhar em uma ficção com personagens chamados Da Shi, Wang Miao ou We Wenjie. Que comem tripas fritas regadas a erguotou (destilado de sorgo, conhecido como a "vodca chinesa") enquanto discutem o futuro da humanidade.

O mais importante é que o livro é um elogio à ciência. Cixin, ele mesmo um engenheiro e cientista da computação que trabalhou por anos em uma usina termoelétrica, mostra como o apoio à ciência fez a China dar um salto de economia rural para potência tecnológica em menos de 30 anos.

Essa é uma bela lição. No Brasil, onde ciência é tratada como algo supérfluo, ela não tem apoio nem na ficção nem na realidade. 

Ronaldo Lemos - advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro ronaldo@itsrio.org

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