Pagamento via celular se populariza na China; em breve, ganhará o mundo


Para ter uma clara ideia de como será o mundo daqui a quatro anos no que diz respeito a como fazemos pagamentos no dia a dia, basta olhar para a China de hoje. A maioria absoluta dos pagamentos feitos no país é realizada por celular, por meio de um código QR (QR code).

Trata-se de um tipo de código de barras bidimensional, formando um quadro com pequenos pontos pretos sobre fundo branco. O símbolo pode ser lido por qualquer aparelho. Sua vantagem é que é capaz de armazenar 300 vezes mais informação que um código de barras tradicional.

A adoção do QR code como interface de pagamentos foi tão rápida e abrangente na China que mudou a percepção social sobre o que é o "dinheiro". Para ter uma ideia, em 2016 o volume de pagamentos digitais feitos dessa forma atingiu US$ 5,5 trilhões. Se você mostrar um QR code para uma criança chinesa e perguntar o que é, ela vai dizer: "dinheiro". É possível ver moradores de rua em Pequim carregando placas com seu QR code. Deixar um chapéu no chão na expectativa de receber doações tornou-se inviável. A chance de encontrar alguém com dinheiro no bolso é muito pequena.

Outra mudança diz respeito às gorjetas. Em vários restaurantes do país, atendentes usam um crachá com o seu QR code. As gorjetas são dadas diretamente pelos clientes, que usam o celular para ler o código de cada atendente e pagar individualmente pelo serviço. Isso levou a um aumento no valor das gorjetas recebidas, dada a facilidade (e a propensão para gastos impulsivos) que o QR code propicia.

Há também relatos de noivas e noivos que, em vez de fazerem uma lista de presentes, simplesmente colocam seus QR codes na entrada da festa de casamento, permitindo que os convidados doem ali mesmo, usando o celular, suas contribuições.

Outro impacto é a facilidade de realizar micropagamentos. Como as taxas de administração são muito baixas ou até inexistentes, isso permite o surgimento de serviços de aluguel temporário de objetos em toda parte. O mais visível são as bicicletas espalhadas por todas as granes cidades chinesas, que podem ser alugadas por alguns centavos cada uma, usando o celular. Mais do que isso, é possível alugar guarda-chuvas, ou mesmo baterias e carregadores de celular, pagos pelo uso.

Outro aspecto importante é que o sistema é "agnóstico" com relação ao tipo de moeda utilizada. Pode-se usar yuan (a moeda chinesa) ou qualquer outra, inclusive moedas virtuais como bitcoin e moner. A conversibilidade é automática. A maioria das pessoas nem se dá ao trabalho de converter créditos virtuais em yuan, já que o dinheiro virtual é muito mais fácil de usar que o "real".

Essa mudança é inevitável. O que está passando na China se tornará padrão no mundo todo, a questão é só de tempo. Os impactos disso para a sociedade e para a política monetária são profundos e estão em aberto.

Ganhará boas gorjetas quem sair na frente nesse campo no Brasil.

Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil.

Fonte: coluna jornal FSP

 

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