Ninguém mais precisa de mim, e agora?


Algumas pessoas vivem em função de outras e esquecem de olhar para si mesmas

Algumas mulheres que entrevistei estão experimentando a “síndrome do ninho vazio”. Elas estão sofrendo muito com a saída dos filhos de casa. Após décadas de dedicação quase que integral à família, sentem-se inúteis, desnecessárias e com muito medo da nova realidade que precisam enfrentar.

Uma dona de casa de 61 anos me contou que passou a vida inteira cuidando da casa, dos filhos e do marido. Ela usou como metáfora para a sua vida a divisão do frango assado nos almoços de domingo.


Idoso chinês em um parque público de Pequim (China) –

 

“As coxas ficam com meu marido, as sobrecoxas com meu filho mais velho, a carne branca com as minhas duas filhas e as asinhas com o caçula. E eu? Para mim, sobra o pescoço. Só compro coisas para mim nas liquidações, sempre fico com o resto. Na grande maioria das vezes fico sem nada”. 

Ela está muito deprimida desde que o filho mais novo saiu de casa.

“Nunca tive vida própria. Vivia para eles. Meus sonhos e desejos sempre foram ignorados, escondidos, inclusive de mim mesma. Será que a minha única vontade era ser mãe, esposa e dona de casa? Na verdade, nunca me perguntei o que eu realmente queria e precisava para ser feliz.”

Hoje, sem saber como lidar com a sensação de vazio, tristeza e solidão, ela se arrepende de ter se colocado sempre em último lugar. 

“Mesmo nos momentos mais difíceis eu deveria ter pensado: tenho que fazer uma coisa boa para mim, não só para os outros. Poderia ter feito uma faculdade, trabalhado, cuidado mais da minha saúde, viajado com as minhas amigas. Mas nunca sobrou tempo e dinheiro para mim.” 

Suas duas filhas estudam, trabalham, deixaram para casar e ter filhos mais tarde. Os filhos estão morando no exterior.

“Tenho inveja das oportunidades que eles tiveram e que eu nunca pude ter”.

Ela se pergunta com muita angústia: “E agora que ninguém mais precisa de mim, o que eu vou fazer? Qual é o sentido da minha vida?”.

 

Mirian Goldenberg - antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio, é autora de "A Bela Velhice".

Fonte: coluna jornal FSP

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