É difícil escrever sobre suicídio, um tema tabu,
mas não estou mais só
Soltar as dores
foi o que me tirou do buraco: eu parei de querer desistir e comecei a pedir
ajuda quando aperta
Não é racional. Chega um dia que chega.
Chegou um momento em que nada aliviava a dor que eu
sentia. É difícil escrever sobre esse assunto, é tabu. Quase ninguém fala
explicitamente sobre suicídio.
Comigo, foram algumas tentativas. Nada, nada, nada
conseguia tirar a dor no meu peito. Sentia uma dor, uma solidão que não era
aplacada nem no meio de tanta gente.
A atração pela finitude era constante. Não
pensei em ninguém. É um ato egoísta, sim, e irreversível.
Falhei todas as vezes. Por isso estou aqui: vivendo
um dia de cada vez e tentando entender melhor os meus sentimentos.
Resolvi criar esta coluna porque acho que pouca
gente que passou por isso fala abertamente. Não só sobre o álcool, que, sim,
pode ser um passo para a morte, mas sobre todos os sentimentos que envolvem
enfiar o pé na jaca sem medir as consequências.
A dor de uma ressaca é quase um
pedido de "por favor, me mate agora".
Nas piores ocasiões, eu gritava, chorava. Depois de
tanta lambança, bebendo tudo que via pela frente, precisei encarar as
consequências —e elas são duras.
Não curtia mais os dias. Temia sobretudo os
ensolarados, que só pioravam minha ressaca. Ficava, muitas vezes, num quarto
escuro, deitada, esperando passar.
Sofro de depressão desde pequena. Isso,
somado ao álcool, foi um problema horroroso. Eu me perdi. Me isolei. E fui
isolada. Minha cabeça só filtrava notícias ruins. Mas eu fingia naturalidade.
"Mas a Alice? Tão simpática,
divertida..." Eu fazia bem meu personagem.
Quando comecei a escrever, a contar minhas mazelas,
fui sentindo certo alívio. Eu ouvia: "Ah, eu também fico assim."
Recebia dicas. E fui percebendo que não estava sozinha.
O AA também foi fundamental. Porque ali todos
revelam suas dores, sem medo, sem vergonha. E o que se ouve com frequência é:
"Eu também".
Grupos de apoio me ajudaram a perceber que a vida é
o que é. Não tem muito segredo.
Para mim, soltar as dores foi o que me tirou do
buraco. Parei de querer desistir e comecei a pedir ajuda quando apertava.
Porque aperta. Mesmo sem o álcool, as dores aparecem de todos os lugares.
"Viver é perigoso" —mas eu não estou mais
só.
Neste Setembro Amarelo, relembro minha trajetória e
tento compartilhar com vocês um pouco dela, na esperança de alcançar outras
pessoas que também passam, ou já passaram, pelo que eu passei.
ALICE
S.
-site Vida de Alcoólatra