Quem tem medo do 'divórcio grisalho'?


Quem tem medo do 'divórcio grisalho'?

Por que a separação conjugal pode ser uma libertação para mulheres mais velhas?

"Você vai se separar com quase 60 anos? Não tem medo de ficar uma velha deprimida e solitária, ainda mais não tendo filhos para cuidar de você? 

Eu me divorciei e me arrependi profundamente. Nunca mais você vai ter um homem para chamar de meu." Foi isso que ouvi de uma professora da UFRJ. 

Alguns meses depois, a mesma colega me criticou: "Mirian, você acabou de se separar e já está com um novo namorado? Por que tem tanto medo de ficar sozinha? Por que você precisa tanto de homem?".

Respondi que não preciso de homem para nada, que pago minhas contas e gosto de morar sozinha. Mas, sem qualquer expectativa, acabei encontrando o amor da minha vida.

Como tantas mulheres da minha geração, sou um exemplo de duas tendências que estão crescendo no Brasil: o aumento dos "divórcios grisalhos" e o crescimento de casamentos após os 60. 

Tendências que devem crescer ainda mais, estimuladas pelo aumento da expectativa de vida e por uma maior autonomia social, econômica e psicológica das mulheres. 

Além disso, uma separação conjugal não carrega os mesmos medos, preconceitos e estigmas que carregava na geração da minha mãe, que sofreu até a morte, aos 62 anos, em um relacionamento extremamente violento e infeliz.

De acordo com o IBGE, em 2023 foram registrados 440.827 divórcios, um aumento de 4,9% em relação ao ano anterior. 

É importante destacar que as mulheres lideraram os pedidos de divórcio. A idade média dos homens no momento da separação foi de 44 anos, e para as mulheres foi de 41.

divórcio após os 50 cresceu 28% em duas décadas e, pela primeira vez, ultrapassou as separações entre casais jovens, na casa dos 22%. 

Em 2013, o número de divórcios entre pessoas com 60 anos ou mais era de 49.936. Em 2023, foram registrados 90.150, um crescimento de 80,5%.

O tempo médio de duração dos casamentos diminuiu. Em 2010, os divórcios ocorriam, em média, após 16 anos de união. Hoje esse número caiu para 13,8 anos, sendo que 47,7% das separações acontecem após menos de dez anos de casamento. 

Em 2023, 60% dos divórcios não consensuais foram requeridos pelas mulheres.

Também segundo o IBGE, nos últimos anos houve um aumento de 23% no número de casamentos de brasileiros de mais de 60 anos. 

Em 2018 foram cerca de 60 mil, e em 2022, 75 mil. São homens e mulheres que, como eu, apostam no amor e no companheirismo, sem abrir mão de projetos individuais e da autonomia.

O demógrafo José Eustáquio Diniz Alves destaca que, em 2023, a expectativa de vida ao nascer, para ambos os sexos, era de 76,4 anos. 

No entanto, a sobrevida das mulheres que completavam 60 anos chegava a 24 anos adicionais. Enquanto os homens devem alcançar, em média, os 80,7 anos, as mulheres devem chegar aos 84. 

Em vez de lamentar o aumento dos "divórcios grisalhos", Eustáquio celebra a coragem de quem, depois dos 60, escolhe caminhos de liberdade e felicidade impensáveis em gerações anteriores.

Na minha pesquisa sobre envelhecimento, autonomia e felicidade muitas mulheres que se divorciaram após os 60 afirmaram: "Nunca fui tão livre, nunca fui tão feliz. É a primeira vez na vida que posso ser eu mesma. Só na maturidade tive a coragem de dizer não e consegui ligar o botão do foda-se para os meus medos, vergonhas, preconceitos e tabus da idade. O divórcio foi a minha libertação grisalha".

MIRIAN GOLDENBERG - antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autora de "A Invenção de uma Bela Velhice"

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