Quem tem medo dos robôs?


Arautos do capitalismo pregam intervenção estatal na robótica para evitar aumento da desigualdade.

Na visão anglo-saxônica, robôs são vistos como inimigos potenciais, prontos para se revoltarem contra os donos a qualquer momento. Daí as leis da robótica de Isaac Asimov, pregando obediência total e proibição de fazer mal a humanos.

Já entre nós brasileiros as narrativas são diferentes. Os robôs são vistos como figuras simpáticas e, por que não dizer, cheias de malemolência. Um exemplo é o conto de 1961 da imortal Diná de Queirós, chamado "O Carioca". Nele, o carioca do título é um robô que passeia pelo Rio de Janeiro e faz tórrida companhia a uma jovem viúva em suas tardes solitárias na cidade.

Esse nosso otimismo com robôs pode ser revisto na visita da presidente Dilma Rousseff aos EUA. Ao passear no carro-robô do Google, que se autodirige, sua reação de alegria e surpresa foi equivalente à da jovem viúva no conto "O Carioca". Encantada, afirmou: "Acabei de descer do futuro", classificando o carro como "absolutamente fantástico" e conclamando "Vambora!".

Enquanto isso, em terras anglo-saxônicas o debate sobre o impacto da onda vindoura de robôs para questões como o trabalho e a desigualdade fica cada vez mais forte. Vale ler a última edição da revista "Foreign Affairs", que faz um ótimo balanço da discussão.

Nela, Daniela Rus, professora de Inteligência Artificial do MIT, afirma que assim como os 80 consolidaram a ideia de cada um ter seu "computador pessoal", a próxima década vai ser do "robô pessoal". Os professores Erik Brynjolfsson e Andrew McAfee, também do MIT, alertam sobre a possibilidade de que os robôs possam fazer com que o trabalho humano fique tão obsoleto quanto o dos cavalos. Eles lembram que em 1900 havia 21 milhões de equinos nos EUA. Em 1960, 3 milhões. Claro que a questão é mais complexa --e isso é debatido no artigo--, mas o alerta é forte.

Qual a solução proposta para o problema? Maior presença do Estado na economia. Erik e Andrew propõem que o Estado torne-se acionista em frotas robóticas do futuro. Os dividendos obtidos a partir delas seriam distribuídos para a sociedade como um todo. Uma espécie de "Bolsa Família" robótica, para mitigar desemprego e desigualdade.

Solução parecida propõe Martin Wolf, economista-chefe do jornal "Financial Times". Em face da disseminação dos robôs ele diz: "Pode ser necessário redistribuir renda e riqueza em larga escala. Essa redistribuição pode acontecer na forma da criação de uma renda mínima para cada adulto, junto com suporte educacional e treinamento contínuo". E complementa: "Direitos de propriedade são uma criação social. A ideia de que apenas uma pequena minoria deva se beneficiar de forma esmagadora das novas tecnologias deve ser reconsiderada".

Mundo muito louco esse, onde os arautos do capitalismo anglo-saxônico pregam maior intervenção do Estado para nos proteger das consequências negativas dos robôs, enquanto o trabalhismo brasileiro encanta-se com as possibilidades do futuro automatizado.

Ronaldo Lemos - advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

Fonte: jornal FSP
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