Desligue o celular e a televisão e comece a conversar de verdade


Neste artigo vamos apontar como a presença dos celulares mais sofisticados (“smarthphones”) e da televisão estão acabando com as “boas conversas” cara a cara.

Também vou sugerir uma nova etiqueta para regular o uso adequado desses dois tipos de tecnologia e, por fim, vou lembrar alguns tipos de comunicação não verbal e comunicação verbal que devem estar presentes em uma boa conversa.

As conversas cara a cara estão perdendo espaço para o celular e televisão

O relacionamento social cara a cara está, cada vez mais, perdendo espaço para o relacionamento virtual. Foi-se a época que as pessoas se encontravam para conversar. Agora, boa parte dos papos rola através da internet.

A mídia está cheia de fotos que mostram pessoas, em todos os tipos de locais,  que, embora juntas, aparecem digitando nos seus aparelhinhos, ao invés de prestar atenção aos seus interlocutores: mesas de bar, pátios de escolas e salas de espera.

Os "selfies" acontecem nos locais mais indiscretos e inadequados como velórios e funerais (até o presidente Obama fez o seu durante o velório de Mandela!) e, até, durante assaltos, onde ladrão e vítima posam para a fotografia!

Também rodou na internet uns vídeos que mostra uma professora tomando o celular do aluno que está recendo uma ligação durante a aula e jogando-o no chão.

Alguns bares estão tomando a louvável iniciativa de instalar bloqueadores de celular com o objetivo de eliminar este distrativo de seus ambientes e dar a chance dos frequentadores conversarem entre si.

Conversas telegráficas

Como digitar é trabalhoso, estamos, cada vez mais, desenvolvendo a arte de abreviar as mensagens. Neste aspecto, parece que voltamos à época do telégrafo, onde as mensagens eram cobradas por palavras e, por isso, seus tamanhos eram reduzidos ao mínimo possível, para economizar.

Interferências contínuas

Não é só a redução na quantidade de horas de conversas cara a cara que está acontecendo como consequência do uso da internet e televisão.  Agora, durante as parcas horas de interação cara a cara, ocorrem mil interrupções pelas chamadas do celular, pelos sonzinhos típicos de cada tipo de mensagem e pelos ruídos de vibração que avisam sobre a chegada de novas mensagens.

Vantagens e desvantagens da conectividade total

É bom poder comunicar, a qualquer hora, com pessoas fisicamente distantes. Isso aproximou muito essas pessoas. No entanto, essa mesma conectividade a distância e 24 horas por dia está afastando as pessoas que estão fisicamente presentes.

A televisão é outra grande fonte de interferência nas conversas

Com a popularização da televisão, foi-se boa parte da atenção que antes era dedicada à família e aos amigos que nos visitavam.

A disposição do mobiliário mostra quais são as prioridades: o aparelho de televisão reina (os assentos são orientados mais para a televisão do que para os interlocutores). Agora, a conversa fica restrita aos momentos dos comerciais. Os breves comentários durante a programação sempre são proferidos com aquela sensação de medo de estar interrompendo a atenção que o interlocutor está dedicando ao seu programa favorito.

Nova etiqueta para conversar

Estamos precisando criar uma nova etiqueta que regule o uso do celular e da televisão. Por exemplo, essa etiqueta poderia estipular que seria muito rude e intolerável ficar assistindo televisão durante o jantar familiar.

Quanto ao uso do celular, esta nova etiqueta prescreveria que ficar olhando para ele durante a conversa seria considerado rude e ficar digitando mensagens seria considerado grosseiro.

Nesta nova etiqueta, o celular deverá ser deixado no “guarda celulares” - um local que passará a existir logo na entrada de estabelecimentos finos, onde é esperado que as pessoas conversem. Nestes locais haveria uma sala reservada para aqueles que não conseguem se abster do "vício do celular" por um mínimo  de tempo: uma espécie de "celuródromo".

Nada contra a tecnologia.

Nada de saudosismos. A tecnologia trouxe muitos benefícios e veio para ficar. Agora, conseguimos ficar psicologicamente mais próximos de pessoas que estão fisicamente distantes e psicologicamente distantes de pessoas que estão fisicamente próximas.

 Relembrando como é uma conversa de verdade

Vamos relembrar agora alguns comportamentos e posturas que facilitam, aumentam a eficiência e motivam uma boa conversa.

 

A comunicação não verbal que facilita a conversa

- Mostrar sinais que está disponível para conversar.

Por exemplo, dizer que está com tempo livre; encostar-se a uma superfície; convidar para sentar; interromper o que estiver fazendo (desligar a tevê, desligar o computador); colocar a pasta ou a bolsa que está portando sobre a mesa; fechar a porta para evitar interrupções.

- Assumir uma distância propícia para conversar.

Não ficar nem muito longe nem muito perto do seu interlocutor. Quando ambos estão em pé, deixar o interlocutor estabelecer a sua distância preferida. Depois que ele fizer isso, caso você queira “esquentar” um pouco o relacionamento, se aproxime dele mais um pouquinho (puxe a sua cadeira para mais perto ou dê um passinho na sua direção, mas não exagere).

- Evitar barreiras físicas ente si e o interlocutor.

Barreira é a presença de um obstáculo entre os interlocutores. Existem dois tipos de barreiras: (1) corporal. Por exemplo, as pernas cruzadas de um interlocutor estão interpostas entre ele e o outro; (2) objeto: os interlocutores ficam separados por uma mesa um balcão. É comum colocar uma pasta ou bolsa entre si e outra pessoa quando ambas sentam-se em um mesmo sofá.

- Assumir posições semelhantes às do interlocutor.

Por exemplo, os dois interlocutores permanecem sentados ou os dois ficam em pé; ambos se encostam a uma parede. É importante manter os olhos na mesma altura dos olhos do interlocutor. Assumir posições diferentes daquela adotada pelo interlocutor contribui para quebrar o clima positivo da conversa. Por exemplo, quando um está sentado e o outro em pé, isso contribui para esfriar a conversa.

- Apresentar padrão típico de olhar do ouvinte atento: o ouvinte geralmente olha mais para o falante do que vice versa; olhar para o rosto do interlocutor (olhos, testa, boca); não ficar muito tempo olhando para o ambiente ou outras pessoas.

- Evitar dar atenção para outros acontecimentos que estão ocorrendo no ambiente. Por exemplo, não ficamos olhando demais para as outras pessoas que estão passando próximo do local onde você está conversando. Quando algo absorve a nossa atenção, deixamos de prestar atenção a outros fatos e acontecimentos presentes.

- Orientar a frente do corpo na direção do interlocutor.

Voltar toda a frente do corpo (rosto, peito, púbis, joelhos e pés) na direção do interlocutor. Caso fique desconfortável essa orientação, devido ao excesso de intimidade que ela produz, mantenha um pequeno ângulo entre a frente do seu corpo e o interlocutor.

- Inclinar o tronco na direção do interlocutor (quando estiver sentado).

Quando sentado, o tronco do bom ouvinte deve ser ligeiramente inclinado na direção do interlocutor (inclinado para frente ou para a lateral quando o ouvinte está ao lado ou à frente, respectivamente).

- Sincronizar a emissão dos sinais de recepção e outras intervenções com momentos oportunos da fala do interlocutor. Por exemplo, esperar ele terminar de expor uma ideia antes de posicionar-se a favor ou contra ela.

- Não atrapalhar a comunicação do interlocutor

- Anuir frequentemente com movimentos de cabeça.

Este é um dos principais comportamentos que indicam que o ouvinte está acompanhando, entendendo e concordando com o que está sendo dito.  Este comportamento geralmente é apresentado periodicamente e, principalmente, assim que o falante termina de apresentar uma ideia ou quando esse olha para o ouvinte.

- Emitir vocalizações curtas em reação ao que está ouvindo.

Por exemplo, o ouvinte emite grunhidos e exclamações que indicam que ele está acompanhando o que está sendo dito e que informam como ele está reagindo ao que está sendo dito.

A comunicação verbal durante uma boa conversa

O ouvinte ativo faz pequenas intervenções verbais que contribuem para motivar, direcionar e fornecer feedback para o falante, sem atrapalhar muito o que este está dizendo. As principais destas intervenções são as seguintes.

-    Repetir, com um tom de interrogação, palavras chaves, frases e ideias apresentadas pelo falante, de maneira sintética para estimulá-lo a expandir o que disse. (Fazer perguntas e pedir para explicar tem efeitos similares à esse tipo de repetição). Por exemplo, o falante diz: “Ontem peguei o maior congestionamento quando cheguei da viagem.” O ouvinte diz “Viagem?”. Este procedimento induz o falante a expandir, corrigir, aperfeiçoar ou completar o que disse.

-  Ajudar o falante a elaborar o que está dizendo.

-   Pedir esclarecimentos de pontos obscuros. Não entender o que está sendo dito provoca a perda do envolvimento com a conversa, impossibilita reações corretas ao que foi dito e causa embaraços. Pedir esclarecimento também é um sinal de interesse no que está sendo dito e um sinal que deseja continuar ouvindo. Por exemplo, diga: “Não entendi”; “Explique melhor isso”, “dê um exemplo”.

- Pedir mais detalhes sobre o que foi dito. Por exemplo, diga: “Fale um pouco mais sobre este fato”.

-  Mostrar empatia pelo ponto de vista do falante e pelas suas emoções. Uma maneira de fazer isso é "refletir" os sentimentos do falante. Por exemplo, faça comentários do tipo: “Isto deve ser muito chato para você.”, “Parece que você ficou muito contente com esta notícia”, “Você deve estar feliz com isso.”

- Usar palavras de compreensão que não comprometam você com aprovação do conteúdo do que está sendo dito. Por exemplo, dizer: “Vejo que você está muito convencido desta ideia”, “Parece que você ainda não se decidiu”.

- Resumir as principais ideias e conceitos sobre aquilo que ouviu. Por exemplo, dizer: “Você está em um dilema: ficar em um emprego que paga melhor ou ir para um emprego que paga menos, mas que você gosta mais.” É muito motivador para o falante ouvir um resumo do que ele disse. Ele mostra que o ouvinte estava motivado para ouvir, prestou atenção, entendeu e quer continuar a conversa.

 

Aílton Amélio: é psicólogo clínico,doutor em Psicologia e professor do Instituto de Psicologia da USP. Autor dos livros "Relacionamento amoroso" (Publifolha), "Para viver um grande amor" (Editora Gente) e "O mapa do amor" (Editora Gente).


Fonte: http://ailtonamelio.blog.uol.com.br

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