Muito além do berço


Quarto de bebê

Quase todo mundo já ouviu frases como "essa criança é assim porque os pais não dão limites a ela", "esse jovem entregou-se às drogas porque os pais se separaram quando ele era muito pequeno" ou similares.

Todas elas dizem respeito a um contexto que já fez muito sentido, mas que não faz mais: a de que a "educação vem do berço", ou seja, tudo o que um mais novo faz ou deixa de fazer está direta e unicamente ligado ao que aprendeu ou deixou de aprender com sua família.

Por que essa ideia não é mais aplicável? Por diversos motivos, mas hoje vou tratar de um deles: porque não é mais somente a família que educa seus filhos. Tomemos alguns exemplos.

Uma jovem de 16 anos tem utilizado de maneira quase obsessiva todos os aparelhos disponíveis para estar sempre plugada nas redes virtuais. Os pais não deram celular a ela antes que fizesse 14 anos, usava internet sempre acompanhada de perto e nunca pôde ter páginas em qualquer rede social antes dos 16 anos. Mas, assim que ganhou o acesso, fez adesão total aos aparelhos e à rede.

Dois irmãos, ainda na infância, fazem parte de uma família que usa palavrões com muita parcimônia e não usa a maioria deles por considerá-los ofensivos, humilhantes, grosseiros etc. Acontece que os filhos têm aprendido muitos deles na escola e os repetido, por mais que os pais conversem e expliquem que não devem fazer.

Uma garota de 15 anos está em tratamento porque só come "porcarias" e isso tem lhe custado problemas de saúde. A família faz pelo menos uma refeição em grupo diariamente e a alimentação é caseira e saudável, sem exageros.

Faltou "educação de berço" a essas crianças e adolescentes? Não. Acontece que todos eles são educados também na escola –e não apenas pelos educadores profissionais–, pelas mídias de todos os tipos, pelo contexto social em que vivem e também por aqueles que observam à distância, pelos estilos de vida que são adotados por grupos que eles admiram, pelo nosso trânsito e as barbáries que nele acontecem etc. E muitos outros "et ceteras"...

Hoje, a família é mais a referência que dá aos filhos o norte do grupo ao qual pertencem do que fonte principal da educação. Quando os pais proíbem os filhos de qualquer coisa por colidir com seu norte, isso não significa que o filho irá acatar a proibição, mas, se ele tiver apreço pelo sobrenome que carrega, certamente irá lembrar-se da proibição antes de fazer suas escolhas.

Os pais da garota que usa a tecnologia com tanta voracidade podem, por exemplo, acordar um tempo sem uso quando estão todos juntos, não muito mais do que isso. A família dos irmãos que falam palavrões pode vetar o uso deles em casa e explicar por que criticam o uso deles, por qualquer pessoa, inclusive as que aparecem usando tais palavrões nas mídias, como alguns políticos. Finalmente, os pais da adolescente que só quer comer fast-food podem diminuir o acesso dela a esse tipo de comida e insistir para que as refeições que têm juntos sejam um bom momento afetivo.

O que importa é que as famílias apontem sempre o seu norte, e que todos tenham consciência de que a educação que os pais dão aos filhos NÃO É vacina contra nada. Quem sabe assim deixemos de responsabilizar apenas a família por tudo o que ocorre com os mais novos, não é?

 

Rosely Sayão - psicóloga e consultora em educação, fala sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar e dialoga sobre o dia a dia dessa relação.

Fonte: coluna jornal FSP

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