A ocasião faz o padrão...


Posso eu ter uma carreira em que a sorte tem seu papel? A circunstância favorável, sim. Ela sozinha não é suficiente. A sorte, isto é, a circunstância, a ocasião, a chance, é essencial, mas não exclusiva. De nada adianta ela aparecer se eu não tiver o movimento, a inclinação, a orientação, a tendência de seguir naquela direção. E de nada adianta eu tomar determinado rumo se não tiver competência para lidar com aquela circunstância. De que me vale, se músico sou, achar um violino Stradivarius na rua, se não sou capaz de extrair uma nota afinada daquele instrumento?

Vale também um exemplo na direção oposta. Recentemente, foi criada a denominação “filósofos pop” para expressar o fenômeno de profissionais dessa área ocupando cada vez mais espaços na mídia. Qual a circunstância que levou a essa condição? O mundo digital, que amplificou, numa dimensão magnífica, ideias que já se tinha, com as quais já se lidava em sala de aula.

Quando a internet passou a fazer parte de forma efetiva no cotidiano das pessoas, muitos já estavam prontos. É claro que foi necessário fazer alguma preparação para se navegar com mais desenvoltura nesse mundo digital. Mas uma série de variáveis foi se agregando: a cultura digital, as redes sociais, a presença nos demais veículos de comunicação, a nova geração tomando contato com certos conteúdos no YouTube (ainda que muitas vezes pirateados). O que aconteceu com a Filosofia nos últimos dez anos? Ficou mais banal? Em algumas situações, pode-se dizer que sim. Mas ela coincidiu com uma nova geração que cresceu nos últimos vinte anos usando com total desembaraço as plataformas digitais, e também com sentimentos de isolamento e percepções de inutilidade ou de superficialidade, trazidos à tona pela tecnologia.

Como antídoto a essa banalidade, a Filosofia, com sua aura histórica de lidar com conteúdos profundos, vinha sendo propagada por professores que também são bons comunicadores. E, como já o eram em sala de aula, encontram na internet, na televisão, no rádio seu território de expressão. Foram vários fatores que coincidiram para criar essa situação.

Insisto nesse ponto porque essa “coincidência”, “aquilo que incide junto”, está ligada à sincronicidade. Os gregos cultivavam duas expressões para se referir ao tempo: chronos, no sentido de passagem ou contagem do tempo; e kairós, para indicar o momento oportuno, aquele em que algo relevante acontece. Há vinte anos, seria no mínimo inusitado ter um professor de Filosofia como comentarista de rádio ou ocupando uma bancada de telejornal para analisar fatos do cotidiano. Isso é resultado de situações afortunadas.

 

Mario Sergio Cortella - professor, Escritor e Filósofo at MSCortella Consultoria

Trecho retirado do livro "A Sorte Segue a Coragem" disponível em: https://amzn.to/2RfZqh1

 

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