Somos
irracionais. E somos previsivelmente irracionais, segundo Dan Ariely,
pesquisador da economia comportamental, que trata de aspectos tanto de
psicologia quanto de economia.
Nossa
irracionalidade ocorre da mesma maneira, repetidamente, seja quando agimos como
consumidores, empresários ou estrategistas. Entender como somos previsivelmente
irracionais é o ponto de partida para aperfeiçoar nossas decisões e melhorar
nosso modo de vida.
A
maioria de nós não sabe o que quer. Então, programamos o cérebro para olhar à
nossa volta, em relação aos outros. Na hora de contratar um serviço, comparamos
com outro já contratado ou disponível. O próximo destino das férias é decidido
por mecanismo semelhante, assim como o vinho que vamos beber no jantar.
Somos
tão previsivelmente irracionais que os profissionais de marketing, cientes de
que não sabemos o que queremos, colocam um chamariz na oferta que fazem para
que nossa escolha recaia sobre o que eles querem vender. O livro
"Previsivelmente Irracional", de Dan Ariely (Elsevier), apresenta
diversos exemplos que comprovam essa técnica.
O
primeiro capítulo do livro é sobre a relatividade que tanto nos ajuda a tomar
decisões na vida. Mas também pode nos fazer muito infelizes. O ciúme e a inveja
nascem da comparação do que temos com o que outras pessoas têm. Miguel, por
exemplo, decidiu procurar seu supervisor para reclamar do salário.
"Há
quanto tempo você trabalha na empresa?", perguntou o supervisor.
"Três anos. Vim direto da faculdade", respondeu Miguel. "Quando
veio trabalhar conosco, qual era sua expectativa de renda anual depois de três
anos?" "Cerca de $ 100 mil", respondeu Miguel. "Você ganha
quase $ 300 mil, por que está reclamando?" "Bem... meus colegas, que
não são melhores do que eu, ganham $ 310 mil". A medida de felicidade de
Miguel não é o seu próprio salário, mas seu salário relativo ao dos colegas na
mesma função.
Já
que é assim que o cérebro funciona, o que podemos fazer para aumentar nossa
felicidade? Podemos controlar os círculos à nossa volta, fazer parte de um
grupo que possa elevar nossa felicidade relativa.
Numa
festa, por exemplo, evite se aproximar de quem conta vantagem do salário que
recebe e vá conversar com outro grupo. Se estiver comprando uma casa ou um
carro, evite visitar ou testar os que estão acima de suas possibilidades.
Concentre-se em conhecer e selecionar aqueles pelos quais você pode pagar.
Outra
estratégia é alterar o foco, de estreito para amplo. Ariely comenta sobre
interessante pesquisa de Amos Tversky e Daniel Kahneman. Suponha que você saiu
de casa para comprar duas coisas, uma caneta simples e um terno para o
trabalho. Você encontra uma caneta bonita por R$ 25, mas antes de comprar se
lembra de que viu a mesma caneta por R$ 18 em outra loja, a 15 minutos de
distância. Vale a pena caminhar 15 minutos para poupar R$ 7? A maioria dos que
participaram da experiência decidiu que sim.
Você
acha um terno bacana por R$ 455 e está quase pagando por ele quando um cliente
cochicha no seu ouvido que o mesmo terno custa R$ 448 em outra loja, a 15
minutos dali. A maioria respondeu que não caminharia para poupar R$ 7. Mas o
que acontece? Quinze minutos do seu tempo valem R$ 7 ou não?
Esse
é o problema da relatividade. Comparamos a vantagem relativa da caneta barata
com a cara e decidimos que vale a pena gastar o tempo extra para poupar R$ 7.
Por outro lado, a vantagem relativa do terno mais barato é pequena demais,
então decidimos gastar mais R$ 7.
Fácil
gastar R$ 3.000 para colocar um banco de couro em um carro que custa R$ 30.000,
mas é difícil gastar R$ 3.000 em um sofá para nossa sala de estar, mesmo
sabendo que vamos passar muito mais tempo no sofá do que no carro.
Se
pensarmos com perspectiva mais ampla, podemos avaliar melhor o que fazer com os
R$ 3.000 que talvez sejam gastos na troca do estofamento do carro. Podemos
fazer uma viagem de férias, comprar roupas, uma TV.
Um
amigo comprou uma BMW e já está pensando que seu próxi- mo carro será um
Porsche. Sabe o que os donos de Porsche querem ter? Uma Ferrari. Quanto mais
temos, mais queremos. Segundo Ariely, a única cura é romper o ciclo da
relatividade.
Marcia Dessen - planejadora financeira
pessoal, diretora do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais
Financeiros e autora de 'Finanças Pessoais: o que fazer com meu dinheiro'
Fonte: coluna no jornal FSP