O Universo é feito de simetrias


Formas simétricas estão presentes em seres vivos, minerais e até na arte

Nossa primeira experiência com simetria ocorre em frente ao espelho, na primeira infância. A fascinação de descobrir o mundo “do outro lado”, estranhamente parecido com o nosso, é inesquecível. Mas simetria é muito mais: sabemos hoje que ela é um aspecto fundamental do tecido do Universo.

“É apenas um pequeno exagero dizer que a física é o estudo da simetria”, afirmava Phillip Anderson, prêmio Nobel da física em 1977. A matemática Emmy Noether provou que “a cada simetria matemática de um sistema corresponde uma quantidade física preservada pela evolução desse sistema”. Este teorema tem papel fundamental na física, especialmente na mecânica quântica, onde explica propriedades das partículas subatômicas (carga, spin etc.) como resultado de certas simetrias matemáticas do Universo.


Pilares do monumento criado por Appie Drielsma. Os quatro pilares do monumento simbolizam os quatro grupos religiosos

(Neutro, Católico Romano, Protestante e Judeu) que viviam na Holanda durante a Segunda Guerra Mundial –

 

A membrana do vírus da gripe é formada por apenas quatro tipos de proteínas, que se encaixam em um padrão geométrico repetitivo: o código genético para construir tal estrutura é mais econômico do que seria necessário para um padrão menos simétrico. Organismos vivos tiram proveito de simetrias de muitas outras formas para economizar no uso de recursos. E minerais estruturam-se em formas cristalinas cheias de simetrias porque estas requerem menos energia.

Simetria também tem protagonismo na arte, claro. Leonardo da Vinci baseou sua “Última ceia” numa composição simétrica: a posição de Cristo isolado no centro acentua dramaticamente sua solidão às vésperas da paixão. Perfeita simetria das feições é parte do que faz de Nefertite, rainha do Egito antigo, “a mulher mais bela de todos os tempos”. Também é da simetria dos elementos arquitetônicos que emana o encanto estético do Taj Mahal. Até Johann Sebastian Bach fez uso de padrões simétricos em algumas de suas composições musicais.

Os dicionários contêm muitas definições de simetria, a maioria fazendo referência a “beleza”, “equilíbrio” e “harmonia”. Prefiro esta, que diz mais sobre o conceito: “invariância (do objeto ou sistema) sob a ação de uma ou mais transformações”. No caso do espelho, a transformação é a reflexão na superfície espelhada. Há versões mais complexas: por exemplo, caleidoscópios usam combinações de espelhos, usualmente três, para criar imagens fascinantes.

Também há simetrias de outros tipos. A estrela do mar, com seus 5 “braços” apresenta simetria de rotação: se rodarmos o corpo 72º (= 360º dividido por 5) em torno do centro, a aparência fica inalterada (mas o bicho pode ficar um pouco desorientado...). Já o calçadão de Copacabana apresenta simetria de translação: se deslocarmos o padrão da calçada na direção do mar, por uma distância adequada, a sua aparência permanece a mesma.

Um notável resultado matemático, chamado Teorema Mágico, descreve todas as simetrias que existem em duas dimensões. Escreverei sobre isso na próxima semana.

Marcelo Viana - diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada, ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.

Fonte: coluna jornal FSP

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