A EXEMPLO DE PORTO RICO, EUA USAM FUNDOS DE PENSÃO PARA PAGAR CONTAS


Por Romina Boccia

Porto Rico iniciou o novo ano deixando de pagar US$ 37 milhões aos detentores de títulos públicos. Mas isso não é novidade. A “Commonwealth” também deixou de pagar parte do que devia em títulos em agosto do ano passado. 

O que mais chamou a atenção foram os comentário do Secretário de Tesouro americano, Jack Lew, pouco antes da data em que o pagamento deveria ser feito. Em 28 de dezembro, durante entrevista ao canal Fox Business, Lew disse o seguinte a respeito do governo porto-riquenho:

“Eles efetivamente entraram em default. Eles já vinham tirando dinheiro de fundos de pensão para pagar despesas correntes. Eles têm movimentado recursos de um credor para pagar outro credor. Isso é default, efetivamente. Não é preciso esperar que um cupom deixe de ser pago para saber que é calote.”

O que torna a afirmação de Lew curiosa é que há pouco tempo a agência governamental sob sua tutela “tirou dinheiro de fundos de pensão para pagar despesas correntes”.

Após 16 de março de 2015, o Tesouro “movimentou recursos de um credor para pagar outro credor” ao pegar dinheiro emprestado do Thrift Savings Plan - o plano CD do governo federal dedicado a servidores públicos e membros do congresso.

O limite estatutário da dívida foi restabelecido naquele dia e o Tesouro não possuía recursos suficientes para fazer frente a todas as suas obrigações junto ao governo federal. Sem poder fazer outros empréstimos nos mercados públicos devido ao limite que havia sido fixado, o Tesouro recorreu às “medidas extraordinárias”, uma espécie de lacuna de dívida.

A lacuna

A lacuna utilizada pelo Tesouro envolve o empréstimo de recursos do fundo G do Thrift Savings Plan. Tal fundo conta com aproximadamente US$ 200 bilhões em títulos públicos de curto prazo não comercializáveis emitidos especialmente para o Thrift Savings Plan (similar aos títulos especiais emitidos para a Previdência Social).

O Congresso buscou lidar com as lacunas nos limites de dívida em 1985 após uma crise ocorrida naquele ano. O parlamento autorizou o Tesouro a tomar empréstimos de determinados trustes federais, incluindo o Fundo G, caso isso fosse essencial para prevenir alguma falha na observância dos limites estatutários de dívida,  impedindo o Tesouro de arcar com suas obrigações. (Uma vez que tais condições deixem de existir, o Tesouro deve devolver os recursos a esses fundos com juros e correção monetária). No ano passado, o Tesouro recorreu a tais medidas entre março e novembro.

Se tomar emprestado dos fundos de pensão para fazer frente a despesas correntes pode ser considerado default, conforme o Secretário Lew deu a entender durante a sua entrevista à Fox, estariam os EUA em tal situação desde o verão passado, quando o Tesouro fez um empréstimo junto ao Fundo G a fim de continuar gastando dentro dos limites fixados?

Como as previsões mais pessimistas acerca dos impactos desse default sobre a economia americana acabaram não se materializando, isso explicaria a apatia dos investidores em relação ao fato de os EUA estarem tomando dinheiro emprestado de fundos de pensão? 

Priorizando gastos

Será que os investidores esperavam que o governo federal fosse elevar os limites de dívida, tornando a situação de default temporária? Ou será que os investidores, cientes de que os EUA emitem sua própria moeda, acreditam que o país sempre poderá recorrer a emissão de moeda para repagar suas dívidas?

Seja qual for a situação, fica a dúvida: será que os investidores teriam uma reação diferente se o Congresso se recusasse a elevar o limite da dívida mesmo após o Tesouro ter exaurido todas as suas opções? Tal situação certamente faria com que o Tesouro fosse obrigado a priorizar certos pagamentos em detrimento de outros.

Como a equipe do Government Accountability Office explicou, “O Tesouro é livre para liquidar suas obrigações da forma como julgar mais apropriada aos Estados Unidos”.

A priorização de pagamentos obedecendo-se os limites de endividamento, apenas com os recursos disponíveis ao Tesouro em determinada data, levaria a atrasos no cumprimento das obrigações. Nesse caso, será que os investidores fariam “vista grossa” para o default assim como fazem quando tiram proveito das lacunas de endividamento ou em casos de “fechamento temporário” do governo, os famosos “shutdowns”?

A questão mais importante é: quando os investidores chegarão à conclusão de que o governo americano está tomando empréstimos em níveis insustentáveis e que a falta de vontade política impede que sejam feitas reformas necessárias para atingirmos a sustentabilidade fiscal?

Embora o governo dos EUA possa colocar suas máquinas de imprimir dinheiro para fazer hora extra quando bem entender, o fato é que o default via inflação é o pior tipo de calote.

 • Boccia  é pesquisador de assuntos orçamentários do Instituto Grover M. Hermann da Heritage Foundation e diretor adjunto do Roe Institute for Economic Policy Studies.



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